Desafio 1: Ser uma
vida religiosa com raízes místicas
A modernidade não cumpriu a grande promessa com a qual
seduziu povos e instituições: transformar o mundo num paraíso. O que fez foi reduzir
a vida a um paraíso tecnológico, desencantando-a totalmente. Nem mesmo as
promessas da modernidade na sua versão marxista se realizaram como alguns
teimam em ignorar, e a própria mudança social pode acabar sendo reduzida a uma
teconologia social desprovida de utopia e de humanidade, sem profundidade e sem
horizontes.
A vida só é possível se for reinventada, poetiza
Cecília Meirelles. Um caminho que não tem coração não merece ser trilhado. O
que hoje muita gente sabe é que a realidade é muito mais daquilo que é hoje,
daquilo que deixa perceber de si mesma. Há um mistério que habita, une e move
todas as coisas. Há um espírito imanente, que não se deixa apreender nas
aparências e apenas se insinua no fenômenos. A vida é sacramento de algo maior
que ainda não se deixa ver, ou ainda não se manifestou no mundo.
Hoje a Vida Religiosa precisa superar o
fundamentalismo institucional, o moralismo estreito, a visão horizontalista e
um certo pragmatismo apostólico e cultivar a capacidade de perceber uma Presença ou Ausência que dá sentido, unidade e dinamismo à história. Este é o
primeiro desafio que a interpela, e também a sua possibilidade de viver como
quem honra a vida, e não simplesmente como quem dura, como quem sobrevive.
Precisamos cultivar um olhar sensível ao mistério!
É claro que não se trata de um sentimento intimista e
confuso, pronto a espiritualizar tudo e nada. O desafio e o caminho é
desenvolver uma espiritualidade pneumatológica e cristã, que nos ajude e ensine
a perceber o “mais” de sentido e de beleza que está por trás e dentro das
pessoas, grupos, iniciativas, coisas e acontecimentos. Como testemunhava Luís
Carlos Borges, não obstante seu crasso agnosticismo e a cegueira que o feria no
final a vida: “Passados os anos tenho observado que a beleza, como a
felicidade, é freqüente. Não há um dia em que não estejamos, um instante, no
paraíso.”
Mas não podemos esquecer que mística cristã supõe e
requer momentos, espaços e símbolos nos quais possa se expressar, alimentar e
reproduzir. Entre tantos, não podemos esquecer a despojada e habitada solidão
da oração; a escuta cordial da Palavra; a beleza graciosa da dança e da poesia;
o silêncio profundo e eloquente; a densidade comunicativa dos símbolos e ritos;
a bela e exigente fidelidade nas pequenas e grandes coisas e momentos; a doação
fecunda no compromisso intransitivo com a vida e a causa dos mais pobres e
indefesos...
Itacir Brassiani msf
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