quinta-feira, 9 de abril de 2015

SEGUNDO DOMINGO DA PÁSCOA (ANO B – 12.04.2015)

Quem crê, vê mais longe, vê com o olhar de Deus.

A experiência e a fé na ressurreição de Jesus Cristo é gerada em ritmo de missão. Por isso, as portas da Igreja não podem permanecer fechadas por medo ou por comodismo. A paz oferecida pelo Senhor ressuscitado que, sem perder as feridas abertas nas mãos e nos pés, se faz presente no meio de nós, nos envia como cordeiros que carregam o pecado do mundo. “Assim como o Pai me enviou, eu envio vocês.” Mesmo sem tocar nas mãos feridas do Cristo ressuscitado, reforcemos nossos vínculos com a comunidade, reconheçamo-lo presente nos irmãs e irmãos nossos e partamos em missão.
João sublinha que era noite e que as portas estavam muito bem fechadas. Os discípulos estavam desanimados, amedontrados e sem perspectivas. É o mesmo escuro pavoroso que haviam experimentado quando atravessaram sozinhos o mar agitado, depois que Jesus saciara a fome de uma multidão e recusara o poder político (cf. Jo 6,16-21). Esse escuro lembra também a escuridão que se fez às três horas da tarde, quando Jesus fora crucificado. Ao medo da possível perseguição pelas autoridades judaicas se juntava a frustração pela imagem de um Messias crucificado...
Dói na consciência dos discípulos a traição, a negação e a deserção no caminho da cruz. Eles não formam uma comunidade, mas um grupo rachado, frustrado, envergonhado. Mas remorso e medo não são muros que impedem a manifestação de Jesus. Ele se faz presente inesperadamente, e sua primeira palavra não é de advertência ou acusação, mas de acolhida e pacificação: “A paz esteja com vocês!” E lhes mostra as feridas nas mãos e no lado esquerdo, assegurarando que sua história concreta é importante, que sua presença não é mera fantasia e que seu amor fiel e solidário continua.
A alegria, tão característica da Páscoa, não brota apenas da certeza de que ressuscitaremos um dia, mas também da experiência atual e cotidiana de não sermos condenados, de sermos aceitos como amigos e amigas de Jesus de Nazaré, apesar dos nossos insuperáveis limites, traições e deserções. Mas a alegria e a paz radiante da Páscoa podem esconder um risco: podemos ficar de tal modo extasiados com as imagens de anjos e com as palavras de paz, pela visão de um Cristo exaltado e sentado à direita do Pai, que podemos esquecer que nossa missão de discípulos está apenas começando.
Por isso, depois de afirmar que vem trazer a paz, Jesus confere claramente uma missão aos discípulos: “Assim como o Pai me enviou, eu também envio vocês”. Trata-se de continuar seu próprio trabalho de carregar nas costas a dor e o peso provocados pelo pecado do mundo. É como se ele nos confiasse a tarefa de lixeiros, de passar pelas estradas e campos recolhendo as imundícies produzidas pela cultura consumista e egoísta. É a missão de sermos os cordeiros de Deus nque tiram o pecado do mundo. E esta missão urge, não pode ser postergada para um hipotético amanhã, para quando tivermos tempo.
Esta missão também não pode ser terceirizada ou deixada à responsabilidade dos outros. Jesus Cristo diz claramente que o pecado que não eliminarmos permanecerá aqui, diminuindo e ferindo a vida de muita gente e garantindo o privilégio de poucos. Pois o pecado é a cumplicidade com a injustiça que fere as crituras, e perdoar significa dissolver os laços que vinculam as pessoas a essa cumplicidade, torná-las livres frente à necessidade de cada um cuidar de si e deixar a Deus o cuidado dos mais fracos. Jesus pede que as comunidades cristãs sejam espaços de amor mútuo e de luta pela justiça.
Tendo recebido o Espírito Santo,  os discípulos, antes desanimados e medrosos, tiveram a coragem de inovar e a força para perseverar no ensinamento dos apóstolos a respeito da vida e da ação de Jesus de Nazaré; na união fraterna, para além de todas as fronteiras; na partilha do pão e de todos os bens; na oração e na liturgia. É assim eles dão testemunho da ressurreição de Jesus Cristo. Abraçar a fé em Jesus Cristo ressuscitado nos vincula aos irmãos e irmãs, à partilha dos bens “conforme a necessidade de cada um”, à alegria radiante frente a cada acontecimento, à simplicidade profunda e cordial.
Aqui viemos, Jesus de Nazaré, Cordeiro de Deus, para encontrar aqueles que acreditam em ti, para tocar tuas chagas e acolher de novo teu mandato missionário. Dá-nos tua paz, e envia sobre nós teu Espírito, a fim de que não nos cansemos de carregar o pecado do mundo e que experimentemos a felicidade de crer para ver, de acreditar apoiados no testemunho de vida dos outros, de fazer da nossa vida um serviço os irmãos e irmãs. Vem em nosso auxílio para que não demos as costas à comunidade dos homens e mulheres de boa vontade, pois sem ela não conseguimos te reconhecer. Amém! Assim seja!

Pe. Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 4,32-35 * Salmo 117 (118) * 1ª Carta de João 5,1-6 * Evangelho de João 20,19-31)

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